Noite dos Deuses
Em Atenas te descobri,
arqueológica revelação aos meus modernos desejos.
Com meus olhos ávidos te desnudei
das poeiras que te vestiam;
com minhas mãos nervosas te percorri,
tenras reentrâncias e saliências marmóreas;
com meus pés cansados te acariciei
em erótica devoção;
com minha voz andei tua mente
e andaste em mim com tua voz;
com meu corpo todo te cobri,
como para esconder-te do mundo,
proteger-te de outros olhos,
outras mãos, pés, vozes e corpos!
Meu egoísmo durou todo o tempo que durou nossa noite,
maratona de amor.
Quando a manhã acordou os deuses e os mitos adormeceram,
voltamos a ser estátuas humanas e calamos.
Como ruínas do nada.
(Beirute, 28.5.1979)
Poema de Um Outro Tempo
Num buraco negro, desintegrei meu corpo
e renasci integrado num universo novo,
universo inverso;
e vi-me ao contrário, embora o mesmo;
e vi-me alegre, embora triste;
e vi-me acompanhado, embora só.
Nesse universo outro,
a Música é a voz dos homens, que se escutam em silêncio;
pensamentos materializam flores
e as distâncias são percorridas no tempo do desejo.
Desse universo, só trouxe comigo
os delírios que povoaram meus sonhos de menino.
(Beirute, 28.5.1979)