A FAZENDA
Sim, não era um lugar comum. a começar pela velha ponte de madeira que desafiava o tempo e teimava em suportar o peso da vida que passava sempre sobre ela. Anunciava, com o gigante bambuzal que ficava à esquerda que tínhamos, enfim, chegado! Uma curva mais e pronto!
Eis a velha figueira - assombrada, garantiam muitos; o campo de futebol improvisado, à direita; a ladeira enfeitada de coqueiros parecendo altar encimado pela capela, à frente; o pavilhão, estranha construção de madeira coberta de sapê onde se realizavam todas as festas juninas, da padroeira, com seus leilões de roça, inimitáveis, guardava o início da subida.
Pedras lisas e lavadas por chuvas de muitos séculos faziam o caminho do portão até a escada que levava ao pátio principal, terreiro de café noutros tempos. Esse caminho era feito sob a mais bela parreira de uvas que já vi em toda minha vida!
Ordem de desembarcar, não esperávamos! Íamos nos soltando da carroceria como uvas da parreira! E explodíamos de alegria e agitação lembrando formigas lava-pés provocadas com varetas de açúcar! Era o corre-corre para abraçar primeiro, num atropelo que só as avós sabem apreciar, a nossa Vovó Sinhanna, que abria os braços e parecia querer nos abrigar a todos, ao mesmo tempo. Tão frágil... Tão forte!
Saciada a sede enorme de carinho, permitíamos então que os adultos desfrutassem do conversar com Sinhanna. E nos largávamos! Era tanto o que rever: o riacho, o rio, as mangueiras, os pés de fruta-do-conde, laranjeiras, o curral, o moinho do burro, o Pavilhão, a Capela, a parreira de uvas, a cozinha que cheirava sempre a café.
E ainda havia os primos, primas e tios, com quem repartíamos nossa felicidade! A Fazenda representava, além de tudo isso, a liberdade para nossos corações travessos, passarinhos livres da cidade-gaiola!
O RIACHO
O riacho corria manso sob os olhares verdes do bambuzal. O sol, filtrado nos bambus, arrancava faíscas coloridas de sua pele fria.
A tardinha sempre nos via brincando de tomar banho nele, atirando água uns nos outros, em risos que se confundiam com os sons de suas gotas-cristais quebrando-se.
E bom mesmo era correr contra o riacho, batendo os pés de tal maneira que, ao gostoso barulho provocado, se juntasse o protesto estridente daqueles que se viam respingados. E acariciar os seixos multicoloridos que moravam na areia fina de seu leito...