O Menino Jesus

Enquanto o padre rezava a missa do galo

e as beatas cacarejavam pedidos aos seus santos;

enquanto o industrial recebia para a ceia

gulosas possibilidades comerciais;

enquanto todos os homens

 e todas as mulheres decentes da sociedade local,

com suas virgens costuradas, se embriagavam natalinamente,

a cafetina concluía o parto em uma das meninas de nome Maria.

Nasceu um garoto lindo, de muitos fregueses e de pai nenhum!

A Mãe tomou-o nos braços, sorrindo,

e com a água e o sal de uma de suas lágrimas  sobre a testa do menino,

 ela o batizou e deu-lhe o nome de Jesus!

Três Anjos que assistiam à cena exultaram:

Glória a Deus nas alturas!

Paz na terra a Jesus e Maria!

No Céu, Deus que tudo via, chorou comovido

com o nascimento de mais um de seus filhos.

 

(Dacca, Bangladesh, 17.8.1976)

 

Gente Grande

Fim de ano faço trinta e morro.

De mentirinha, é claro.

Viro apenas gente grande, o que já é bem ruim.

Vai ser difícil responder que tenho trinta...

Trinta o quê? Que trinta tive?

Trinta trens? Trinta trilhas? Trinta filhos? Trinta filhas?

Terei tido trinta moedas de prata?

Trinta amigos? Trinta amantes? Trinta vôos bem rasantes?

Fim de ano faço trinta e morro.

Daí, se alguém me pergunta, respondo vinte!

De mentirinha, é claro...

 

(Dacca, Bangladesh, 20.08.1976)