POEMINHA TRISTE

Não, eu não tinha o hábito de ser assim

 tão triste, tão só, tão sonhador;

eu não tinha, acredita, o hábito de vagar assim

pelas pessoas, pelas cidades vazias,

escrevendo poemas como quem vai morrendo

 aos poucos, vítima da saudade.

 

Antes, tudo era diferente:

eu tinha o hábito de poder te amar e de ser amado por ti.

Quando nos reencontramos,

senti que era lindo demais para durar mais que um sonho e,

por isso, no tempo concedido, entreguei-me ao teu amor,

 completamente, no desespero de sabê-lo efêmero.

 

Agora, que deixaste minha vida, está nascendo em mim

o suave hábito de não te esquecer.

 

(Amã, Jordânia, 3.11.1980)
 

O AMOR SEM FRUTOS

Eu te amo, Árvore,

apesar de não ter visto nossos frutos e sabendo que jamais os verei!

 

Amo tua sombra amiga, que me repousou tantas vezes,

quando me protegias do mundo sob a copa dos teus abraços;

 

amo a necessidade vegetal que tens de afeto, de proteção;

amo o perfume único, de madeira nobre, que exala de tua pele;

 

amo o carinho com que recebes os pássaros que te buscam,

estranhos que descansam em ti por alguns instantes e partem;

 

amo a beleza, a sensualidade do teu corpo todo, das raízes aos cabelos;

amo tua voz, som de suave brisa por entre tuas folhas vocais!

 

Eu te amo, Árvore generosa, porque trazes em ti o invisível fruto,

luminoso Amor que se oferece por inteiro, como alimento;

o Amor que se doa de tal modo, por completo,

que não deixa rastros, nem sementes, nem heranças, nem herdeiros!

 

E pensar que, apenas pela impossibilidade de frutos, me abandonaste...

Em mim, permaneceram os restos de tuas raízes,

profundas e ternas recordações que se recusam morrer.

 

(Amã, Jordânia, 3.11.1980)